O que é “NoMo”? Nova onda de mulheres que não querem ser mães
Mulheres que optam por não ter filhos fazem parte de um fenômeno social que envolve mudanças nas normas tradicionais de gênero e uma maior ênfase na autonomia e escolha pessoal.
O Brasil observa um declínio na taxa de fecundidade feminina, que atingiu a marca de 1,62 filhos por mulher, abaixo da taxa de reposição populacional estabelecida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que é de 2,1 filhos. Esse fenômeno é resultado de uma série de fatores econômicos e sociais que afetam a decisão das mulheres de terem filhos.
Mulheres: Uma mudança de padrão
O aumento da participação das mulheres em atividades fora do lar é um dos principais influenciadores nessa mudança de padrão. A crescente discussão sobre a divisão do trabalho de cuidado, ou a sua falta, se torna evidente. As mães em particular expressam as dificuldades enfrentadas ao criar filhos, incluindo a falta de suporte e as dificuldades de conciliar as responsabilidades parentais com o trabalho remunerado.
Além disso, muitas mulheres estão aderindo ao movimento “NoMo,” que vem do inglês “not mothers” (mães não). Esse movimento representa mulheres que escolhem não ter filhos, ou que têm cada vez menos filhos, devido à pressão social e à falta de suporte na criação dos filhos.
o que dizem os especialistas?
Erika Tonelli, cientista social e especialista em direitos das infâncias, destaca a pressão enfrentada pelas mulheres para atender a expectativas culturais, incluindo manter uma imagem perfeita enquanto cumprem múltiplos papéis. Essa pressão tem consequências negativas na saúde mental das mulheres.
A psicanalista Vera Laconelli, autora de “Manifesto Antimaternalista: Psicanálise e Políticas da Reprodução,” argumenta que a sobrecarga das mulheres com o trabalho de cuidado dos filhos desempenha um papel importante em sua decisão de não ter filhos ou de ter menos filhos.
Desafios enfrentados
A maternidade solitária também é um desafio enfrentado por muitas mães. Cláudia Pereira, mãe solteira de gêmeos, é uma das 11 milhões de mulheres no Brasil que não têm apoio para dividir as responsabilidades diárias de criar uma criança. Ela fala sobre as dificuldades financeiras e a falta de apoio emocional.
Dados do Portal Transparência Brasil revelam que quase 140 mil crianças foram registradas sem o nome do pai na certidão de nascimento somente este ano, uma média de quase 500 por dia. Em casos de crianças com deficiência, mais de 70% dos pais as abandonam antes dos cinco anos.
Mercado de trabalho
O mercado de trabalho ainda não oferece o suporte adequado às mães. Pesquisas revelam que cerca de 50% das mulheres são demitidas quando retornam da licença-maternidade. Embora tenham havido avanços, como o Marco Legal da Primeira Infância em 2016, que estendeu a licença-maternidade para 180 dias, as políticas corporativas ainda não atendem às necessidades das mães.
Camila Antunes, da consultoria Filhos no Currículo, destaca que a extensão da licença-paternidade para 20 dias não é suficiente para apoiar as mães na primeira infância das crianças. Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, ressalta que as políticas de licença maternidade variam entre as empresas, sendo mais um exemplo do apoio limitado oferecido às mães.
A psicanalista Elisama Santos argumenta que o mundo corporativo ainda é predominantemente masculino e não oferece o suporte necessário para as mães poderem equilibrar suas responsabilidades profissionais e familiares. A falta de flexibilidade e a visão de que a maternidade diminui a produtividade das mulheres são obstáculos a superar.
Movimento “child free”
A culpa associada à maternidade é um estigma que muitas mulheres enfrentam. No entanto, especialistas argumentam que a responsabilidade pelo cuidado das crianças deve ser compartilhada pela sociedade como um todo, incluindo o Estado, familiares e a comunidade.
O movimento “child free”, que defende restrições de acesso a crianças em locais públicos, reflete a intolerância em relação às crianças na sociedade. Juliana Prates, que estuda psicologia do desenvolvimento e sociologia da infância, enfatiza que as crianças têm direitos na vida social e precisam ser consideradas pessoas com necessidades.
Importância das crianças para a sociedade
Vera Laconelli destaca a importância de ver a criança como um bem para a sociedade, uma vez que elas são fundamentais para seu futuro. O apoio às mães e a valorização da infância são elementos essenciais para garantir um crescimento saudável da população.
A falta de políticas eficazes para apoiar as mães e as crianças pode levar a um declínio demográfico no Brasil, e é um problema que requer atenção e ação por parte da sociedade e do governo. Em suma, a maternidade não pode ser vista como um fardo exclusivo das mulheres, e é necessário um esforço coletivo para promover um ambiente mais equitativo e acolhedor para as famílias.